Jeanne Moreau, cantora sem querer

Miles Davis ensinando trompete para Jeanne Moreau, em 5 de dezembro de 1957, em Paris, cinco anos antes do sucesso de “Tourbillon”. Foto AFP



Texto originalmente publicado em francês no Libération.

Tradução: Jessica Bandeira


Sem nunca ter se afirmado como cantora, Jeanne Moreau colocou sua voz única a serviço das palavras de grandes compositores, assim como de suas próprias, tornando-se um dos maiores tesouros da canção francesa.

Em 1962, Jeanne Moreau estava sentada próxima a um violonista, com as mãos nos joelhos, quando começou a cantar para a câmera de François Truffaut. “Ela tinha anéis em cada um dos dedos...”

A cena de Jules e Jim, uma mulher para dois tornou-se quase um monumento à própria Jeanne e deslanchou a outra carreira da atriz: a da cantora de voz grave, especialmente apegada às palavras. Ela interpretaria as palavras de Rezvani, Norge, Duras, Guillevic, Genet. No entanto, Jeanne Moreau recusava-se a falar sobre qualquer carreira de cantora: “Não use essa expressão, ela me irrita”ela explicava ao Libération em 2002. “Eu tive a oportunidade de poder cantar, o que é um prolongamento natural da atuação”.


Na esteira de Jules et Jim, uma mulher para dois, Revzani, com o pseudônimo de Cyrus Bassiak, escreveu para Jeanne Moreau o segundo grande sucesso dela, J’ai la mémoire qui flanche (1963).




No total, a atriz gravaria dois álbuns completos com as canções compostas por Revzani/Bassiak, em 1963 e 1966. Em 1968, Les Chansons de Clarisse foi lançado, com 17 faixas de Guillevic baseadas na obra de Elsa Triolet e arranjos de Philippe-Gérard.

“Elas me ajudaram a conseguir superar”

A própria atriz escreveu as letras das canções do álbum Jeanne chante Jeanne (1970). “Eu tinha acabado de sair de uma psicoterapia”, ela contou na mesma entrevista ao Libération. “Meu analista me estimulou a escrever ‘minhas coisas”. Eu mostrei pra ele. “Elas dariam ótimas canções”, ele me disse. Ele tinha razão, de qualquer forma elas me ajudaram a conseguir superar. Eu tenho uma dificuldade enorme de escrever, exceto as canções, pois se trata de uma escrita da sensação, ela deve ser rápida, vir de uma vez só. É divertido, escrevi muitas canções”.

Em 1975, ela interpretou aquela que se tornaria um de seus carros-chefe: India Song, uma canção escrita por Marguerite Duras para o filme homônimo (música de Carlos d’Alessio).



Cerca de 12 anos após as Chansons de Clarisse de Guillevic, Philippe-Gérard fez os arranjos para as poesias de outro poeta, o belga Norge. O álbum Jeanne Moreau chante Norge, que não conta com menos de 22 faixas, foi lançado em 1981.



Após um longo período longe da música, foi como recitante, com a voz quase crepuscular, que ela acompanhou, em 2010, Etienne Daho em le Condamné à mort. Os dois artistas lançaram uma versão sublime do famoso poema de Jean Genet, com música de Héléne Martin.


Ao colocar tudo na balança, ainda questionada pelo Libération em 2001, ela declarava que, segundo ela, o que permanece de uma canção é “a energia’. “É uma sensação imediata, que às vezes se estende durante vários minutos, mas que acontece rápido, como um choque”.




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